Carlos Pascoal Neto, Diretor-geral do RAIZ – Instituto de Investigação da Floresta e Papel desafia-nos a refletir sobre o potencial de Portugal na vanguarda de um novo modelo de desenvolvimento que responda aos grandes desafios da atualidade.
Portugal tem todas as condições para ser um líder de referência no contexto europeu da bioeconomia florestal, baseada na indústria de pasta e papel, a par com os países escandinavos, contribuindo de forma decisiva para diminuir a dependência dos recursos fósseis e mitigar as alterações climáticas:
✅ Possui empresas fortemente inovadoras, líderes nos mercados internacionais, com unidades industriais a evoluírem para biorrefinarias, diversificando o seu portefólio de bioprodutos;
✅ Tem condições únicas de solo e clima para a produção da matéria-prima de excelência mundial para este setor, o Eucalyptus globulus;
✅ E possui centros de I&D e inovação, públicos e privados, reconhecidos pelos seus pares internacionais, que estão a gerar conhecimento e a transferi-lo para a floresta e para a indústria.
Não é, no entanto, uma batalha ganha. Atravessamos um período crítico nesta trajetória que, se não for devidamente assumida como um desígnio nacional, poderá comprometer o futuro deste setor e as metas para a neutralidade carbónica em Portugal.
Para afirmar e consolidar esta liderança, precisamos de garantir a disponibilidade de matéria-prima nacional, reduzindo as importações de madeira, geralmente de menor qualidade e com maior pegada ecológica. Portugal tem de assumir a floresta como um setor estratégico, com uma visão de longo prazo, suportada no conhecimento científico, sem enviesamentos ideológicos, respeitando o adequado equilíbrio entre floresta plantada e floresta de conservação, e preservando os valores da biodiversidade. E temos, seguramente, margem para crescer, promovendo o ordenamento do território, colocando economia e gestão na floresta, convertendo em áreas florestais parte dos mais de 30% do território classificados como matos e pastagens, valorizando e remunerando os chamados serviços do ecossistema.
Para termos uma floresta ordenada, produtiva e resiliente precisamos também de recursos humanos qualificados. No entanto, a formação de nível médio ou superior no domínio das ciências e das tecnologias florestais tem vindo a perder atratividade por parte dos nossos jovens, com impacto direto na oferta de mão-de-obra qualificada. É fundamental um programa nacional, com apoio das empresas do setor (que têm feito o seu papel, dentro da sua esfera de ação), que promova a formação florestal, dignifique as profissões ligadas à floresta e à bioeconomia de base florestal.
No domínio da I&D, inovação e transferência de tecnologia, tanto na floresta como dos processos e produtos industriais de origem florestal, existe capacidade instalada para fazermos mais e melhor. É fundamental concentrar esforços de investimento público em I&D&I nas áreas e clusters de maior relevo para a economia nacional, apoiando, através de programas estruturantes de médio-longo prazo, os stakeholders de toda a cadeia de valor.
A bioeconomia de base florestal, pelo seu relevante peso nas exportações nacionais (8%, dos quais 51% do cluster da pasta e papel), carece assim da definição e implementação de uma visão e plano estratégico de longo prazo, suportado em adequadas políticas públicas, conhecimento e ciência, financiamento público e privado, mobilizando todos os atores no terreno, num quadro de um verdadeiro pacto de regime.
Só assim Portugal poderá consolidar a sua posição de liderança europeia da bioeconomia de base florestal.
Por Carlos Pascoal Neto, Diretor-geral do RAIZ -Instituto de Investigação da Floresta e Papel.
Portugal tem de assumir a floresta como um setor estratégico, com uma visão de longo prazo, suportada no conhecimento científico, sem enviesamentos ideológicos, respeitando o adequado equilíbrio entre floresta plantada e floresta de conservação, e preservando os valores da biodiversidade.