E se em vez de procurarmos as espécies que existem num ecossistema, procurarmos aquelas que estão ausentes? Este retrato da chamada Dark Diversity – a “diversidade oculta” – mostra-nos quantas espécies, e quais, já desapareceram de um habitat.
Identificar as espécies presentes num habitat é essencial para avaliar a saúde dos ecossistemas e planear ações de conservação dirigidas às que estão em risco. Mas há outra forma de olhar para os habitats. Um estudo recente, desenvolvido com o contributo de mais de 200 cientistas, propõe precisamente o inverso: fazer o levantamento das espécies ausentes – vegetação natural que deveria existir num determinado local, mas que está em falta.
O estudo, publicado na revista Nature, mostra que em muitas áreas de vegetação natural o número de espécies ausentes é surpreendentemente elevado. A investigação foi liderada por cientistas da Universidade de Tartu, na Estónia, e contou com a participação de Ruben Heleno e José Miguel Costa, investigadores do Laboratório Associado TERRA da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC).
Os investigadores integram a DarkDivNet, uma rede global criada precisamente para monitorizar as espécies de flora ausentes em ecossistemas onde seria expectável que existissem. Contabilizar essa “diversidade oculta” permite revelar uma dimensão que as monitorizações habituais não contemplam e constitui uma nova ferramenta para avaliar o impacto invisível da atividade humana.
Um retrato impressionante
Foram analisados dados recolhidos sobretudo entre 2019 e 2023, abrangendo quase 5500 locais distribuídos por 119 regiões em todo o mundo. Os resultados não deixam dúvidas:
🌿Nos ecossistemas mais afetados, estão ausentes quatro em cada cinco das espécies de flora que seria expectável encontrar;
🌿Nos ecossistemas menos afetados, deixaram de existir perto de dois terços dessas espécies.
Para classificar o nível de impacto das atividades humanas, foi utilizado o Índice de Pegada Humana (Human Footprint Index) que tem em conta fatores como a densidade populacional, a urbanização, a agricultura e as infraestruturas.
Em Portugal, os investigadores analisaram a “diversidade oculta” de 34 locais na região centro, a norte de Coimbra, abrangendo desde habitats florestais bem conservados até campos agrícolas abandonados.
Porque é importante conhecer a Dark Diversity?
Este conhecimento dá às equipas de conservação uma visão mais completa dos ecossistemas, permitindo-lhes compreender melhor as perdas invisíveis de biodiversidade e preparar estratégias mais eficazes para a proteger. Estes dados, que a rede global DarkDivNet, centraliza, permitem:
✅ Estimar a diversidade relativa do local: quantas espécies esperadas estão presentes relativamente às ausentes;
✅ Comparar a biodiversidade entre diferentes regiões e tipos de habitat;
✅ Identificar processos que condicionam a presença e a ausência de espécies;
✅ Avaliar o interesse de conservação e o potencial de restauração de um habitat.
A rede DarkDivNet vai continuar a receber dados, tanto dos membros já registados como de novos investigadores que se queiram juntar a esta missão. O objetivo é reforçar continuamente a base de conhecimento e publicar novos relatórios no futuro.
O estudo “Global dark diversity study reveals hidden impact of human activities on nature” (Diversidade oculta global revela impacto invisível das atividades humanas na natureza) pode ser consultado aqui.