Cerejas em dezembro, sardinhas em janeiro, castanhas em maio. A globalização habituou-nos a ter tudo, sempre. Mas cada alimento que viaja milhares de quilómetros antes de chegar ao nosso prato carrega custos que não se veem no talão: emissões, embalagens, perda de sabor e uma dependência externa que fragiliza o país.
Portugal continua muito dependente do exterior para se alimentar. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2024 o grau de autoaprovisionamento em cereais (excluindo arroz) foi de apenas 17,9% – o que significa que mais de 80% vêm de fora. Também nos frutos a balança é deficitária: cada habitante consumiu 151,1 kg de fruta, mas a produção nacional só garantiu 68,8% desse valor.
Há, felizmente, exceções que mostram o potencial agrícola do país. Como o azeite: Portugal produziu, no ano passado, mais do dobro do necessário para o consumo interno, atingindo 214,9% de autoaprovisionamento. Foi a segunda maior campanha de sempre.
No conjunto, o défice da balança comercial de produtos agrícolas e agroalimentares (exceto bebidas) fixou-se em 5,17 mil milhões de euros em 2024. É um valor negativo, mas ligeiramente melhor do que em 2023, graças a exportações mais dinâmicas. Continuamos, no entanto, a gastar milhares de milhões todos os anos a importar alimentos que, em muitos casos, poderiam ser produzidos cá.
Maior pegada ambiental e menos benefícios para a saúde
A cada quilómetro percorrido por um alimento somam-se custos ambientais: combustível, refrigeração, embalagens descartáveis. Mas há também impactos negativos na saúde: fora de época, frutas e legumes podem perder frescura e nutrientes, enquanto ganham químicos para aguentar viagens longas.
Já o consumo local oferece o oposto: mais sabor, mais frescura e mais identidade. Uma laranja apanhada no Algarve em janeiro dispensa conservantes e viaja pouco. Uma maçã do Oeste no outono mantém intacto o seu valor nutritivo. Além disso, comer local e sazonal ajuda a preservar a diversidade agrícola e a cultura alimentar que nos liga ao território – laranjas no inverno, favas na primavera, tomate no verão…
Apoiar a economia nacional e regional
Valorizar a produção nacional é também reforçar a nossa soberania alimentar: reduzir a vulnerabilidade a ruturas internacionais e choques de preços, apoiar agricultores portugueses e estimular economias locais. Ao mesmo tempo, estamos a contribuir para um planeta mais saudável, com menos emissões associadas ao transporte de mercadorias.
O que pode cada um fazer?
🍅 Procurar o que é da época e da região.
🫛 Preferir mercados municipais, feiras de produtores ou mercearias de bairro.
🇵🇹 Reparar nos rótulos e escolher “Produzido em Portugal”, sempre que possível.
Parecem gestos pequenos, mas todos somados, podem ter um grande impacto: menos pegada, mais sabor, maior autonomia. Se quisermos um sistema alimentar mais justo e sustentável, a mudança começa no carrinho de compras, já na próxima ida ao mercado.