A bioeconomia circular trocada em miúdos

16 de Janeiro 2024

Foi para promover a literacia da floresta, e o conceito de bioeconomia circular associado, que nasceu o projeto Floresta do Saber. Em três anos, somou quase 17 mil visitantes, a maior parte dos quais alunos do Ensino Básico e do Pré-escolar.

As questões da circularidade e da sustentabilidade, e a importância da floresta neste contexto, surgem ainda distantes dos programas escolares. O facto de a floresta ser o principal uso do solo em Portugal, ocupando mais de um terço do país, não quer dizer que a opinião pública a conheça bem ou que a escola lhe dê destaque. Por isso, surgiu o Floresta do Saber, um projeto dirigido sobretudo à comunidade educativa e focado em todos os temas relacionados com a transição de uma economia linear e fóssil para uma economia circular baseada em recursos renováveis.

O espaço físico, na Quinta de São Francisco, em Aveiro, foi inaugurado no final de 2021, mas o projeto, criado e promovido pelo RAIZ – Instituto de Investigação da Floresta e Papel (Laboratório de I&D detido pela The Navigator Company, Universidade de Aveiro, Universidade de Coimbra e Universidade de Lisboa, através do Instituto Superior de Agronomia), já tinha tido início em 2020. A iniciativa contou, ao longo dos três primeiros anos, com o apoio do Programa Gulbenkian de Desenvolvimento Sustentável. Além disso, a sua relevância fez com que o RAIZ fosse reconhecido pela UNESCO Portugal como Clube UNESCO.

Nestes três anos de existência que acaba de celebrar, o Floresta do Saber recebeu quase 17 mil visitantes presenciais, a maior parte deles alunos dos vários ciclos do Ensino Básico e também do Pré-escolar.

Da árvore ao laboratório

“Juntámos a componente que já existia de promoção do contacto dos mais novos com a natureza e com o património histórico-cultural da Quinta de São Francisco, onde fica o RAIZ, com a partilha da investigação e conhecimento científico recente ligado à bioeconomia circular”, explica Sara Monteiro, coordenadora-geral do Floresta do Saber. “Estruturamos programas de atividades definidas e ajustadas a diversas faixas etárias e graus de ensino. Em todas elas procuramos envolver as crianças, queremos que sintam que o projeto é delas”, acrescenta.

 

João Ezequiel, coordenador científico do Floresta do Saber, esclarece que o projeto assenta em três grandes pilares — a floresta, a bioeconomia e a sustentabilidade. É um trabalho educativo, sobretudo de contacto presencial com a comunidade escolar, que permite também apoiar os professores na abordagem destas questões: “Existe a ideia generalizada, de que a floresta é sobretudo floresta natural. O que não é verdade. A maior área de floresta em Portugal, à volta de 98%, corresponde a floresta plantada com interesse económico. E que é absolutamente necessária. Nós dependemos dessa economia. Temos de olhar para a floresta como um recurso natural valioso para o país. Faz falta trabalhar esta ideia nas escolas”, considera João Ezequiel. “As nossas atividades vão nesse sentido. Mostram coisas estruturais e básicas que estão na madeira, substâncias que podemos usar na medicina, cosmética ou nutracêutica. Em última instância, este projeto pretende valorizar a floresta, em todas as suas vertentes, quer natural e ambiental, quer económica e social. Todas as vertentes são importantes”, conclui João Ezequiel.

Desfazer mitos

Outra ideia errada que é desmontada nas atividades do Floresta do Saber é a de que as florestas plantadas apenas produzem matéria-prima para as empresas. “Não é verdade”, afirma o coordenador científico do projeto.  “Elas produzem uma série de serviços e benefícios para toda a sociedade. A começar pela produção de oxigénio, que é óbvia, mas há mais. Como a construção e conservação dos solos e a manutenção dos regimes hídricos, com uma série de ciclos biogeoquímicos envolvidos. Estas florestas são também refúgio para muitas espécies. Isto não é falado – os serviços de ecossistema das florestas plantadas são completamente negligenciados”, aponta João Ezequiel.

As atividades do Floresta do Saber são variadas: desde visitas guiadas à Quinta de São Francisco, que apelam aos sentidos, o que é especialmente importante para as crianças do Pré-Escolar, até atividades nos laboratórios, onde os alunos podem descobrir como os investigadores estudam as potencialidades do eucalipto para o desenvolvimento de novos bioprodutos. O projeto possibilita ainda visitas aos Viveiros de Espirra, em Pegões, onde se pode descobrir como nasce a floresta.

Os professores também têm dúvidas

Para além deste contacto com a comunidade educativa, nas suas múltiplas vertentes, o Floresta do Saber organiza think tanks com várias entidades de diferentes áreas. “A ideia passa por complementar o que está nos programas escolares e ir ao encontro das necessidades que os professores sentem na sala de aula. Os think tanks têm respondido a questões que os próprios docentes fazem. Vamos buscar os nossos especialistas e também investigadores das universidades ou outros peritos capazes de dialogar e responder às questões e dificuldades que os professores do Ensino Básico enfrentam”, explica Sara Monteiro. E acrescenta: “Procuramos sempre este envolvimento com a sociedade civil para promover a literacia da floresta.”

Por outro lado, estes think tanks e o espaço de cocriação servem para capacitar os mais jovens para discussões assentes em conhecimento e ajudá-los a antecipar os futuros com base em estratégias cientificamente validadas, para melhor preparar as nossas gerações do futuro.

“Estruturamos atividades definidas e ajustadas a diversas faixas etárias e graus de ensino. Em todas elas procuramos envolver as crianças, queremos que sintam que o projeto é delas”. Sara Monteiro, coordenadora-geral do Floresta do Saber