Aquecimento global: o momento da verdade

22 de Julho 2024

Vivemos um período em que os recordes de temperatura se sucedem, fazendo soar alarmes. “Estamos a jogar à roleta-russa com o nosso planeta”, alertou António Guterres, secretário-geral da ONU.

O mês de junho deste ano foi o junho mais quente desde que há registo. Foi também o 13º mês seguido em que são batidos recordes mensais de calor. E ainda o 12º mês consecutivo com temperaturas acima de 1,5°C em relação à média estimada para a era pré-industrial (1850-1900). Os dados são do Copernicus, Programa de Observação da Terra da União Europeia, revelados num comunicado.

Entrando em detalhe, a temperatura média global do ar à superfície foi, em junho de 2024, de 16,66°C, ou seja, 0,67°C acima da média registada neste mesmo mês entre 1991 e 2020, e 0,14°C acima do máximo anterior – estabelecido em junho de 2023.

“Mais do que uma raridade estatística, estes valores põem em evidência uma mudança relevante e contínua no nosso clima”, afirmou Carlo Buontempo, diretor do Serviço de Alterações Climáticas do Copernicus (C3S), citado no comunicado. “Mesmo que esta série específica de extremos termine em algum momento, assistiremos a novos recordes à medida que o clima continua a aquecer. Isto é inevitável, a menos que deixemos de emitir gases com efeito de estufa”, alertou.

As previsões avançadas pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), num relatório divulgado no Dia Mundial do Ambiente, apontam no mesmo sentido. O documento refere uma probabilidade elevada, na ordem dos 80%, de a temperatura média anual global poder vir a exceder o limite de 1,5°C acima dos níveis pré-industriais, durante pelo menos um dos próximos cinco anos. O relatório aponta igualmente uma enorme probabilidade (86%) de que pelo menos um destes anos (entre 2024 e 2028) estabeleça um novo recorde de temperatura, superando 2023 – que é, atualmente, o ano mais quente de sempre.

Ainda vamos a tempo…

Todo este contexto motivou António Guterres, secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), a proferir um discurso especialmente enfático, no mesmo dia em que o relatório da OMM foi apresentado: “O planeta está a tentar dizer-nos alguma coisa, mas nós parecemos não estar a ouvi-lo. Estamos no momento da verdade”, alertou. “A verdade é que a batalha pelos 1,5 graus será ganha ou perdida na década de 2020 – sob o olhar dos líderes de hoje. Tudo depende das decisões que esses líderes tomarem – ou deixarem de tomar –, especialmente nos próximos dezoito meses”, declarou.

“Estamos a jogar à roleta-russa com o nosso planeta. Precisamos de sair deste caminho para o inferno climático. Mas a boa notícia é que temos o controlo do volante”, disse ainda António Guterres, deixando uma nota de esperança.

Explicando esta ideia de que, apesar dos sinais de alarme, ainda há tempo para reverter o sobreaquecimento global, Ko Barret, secretária-geral adjunta da OMM, refere que uma ultrapassagem temporária do limite de 1,5 graus Celsius não significa o comprometimento do Acordo de Paris: “A OMM está a fazer soar o alarme de que iremos ultrapassar o nível de 1,5 graus Celsius numa base temporária e com uma frequência crescente, mas é importante dizer que as violações temporárias não significam que essa meta esteja permanentemente perdida, uma vez que se refere ao aquecimento a longo prazo, ao longo de décadas”.

O poder das árvores

As florestas são fundamentais no combate às alterações climáticas, pela sua ação de remoção de carbono da atmosfera. Por isso, os países devem investir intensamente na promoção da reflorestação e no combate à desflorestação. Mas as árvores têm também um papel essencial na mitigação dos efeitos do aquecimento global dentro das cidades. Elas são aliadas incontornáveis para enfrentar as chamadas ilhas de calor urbano – um fenómeno que surge, sobretudo, nas cidades com um elevado grau de urbanização, e que, além de favorecer o aquecimento global, compromete a saúde humana.

O poderoso efeito refrescante das zonas verdes já foi comprovado cientificamente, através de diversos estudos. Um deles, de janeiro de 2023, cruzou diferentes variáveis, como temperatura, densidade populacional, níveis de cobertura por vegetação e mortalidade. Realizado no Instituto de Barcelona para a Saúde Global e publicado sob o título “Arrefecer as cidades através de infraestruturas verdes: análise do impacto na saúde em cidades europeias”, o trabalho demonstrou que uma cobertura de árvores de 30% poderia baixar em 0,4°C a temperatura numa cidade e evitar cerca de 39% das mortes devidas ao calor.

“A batalha pelos 1,5 graus será ganha ou perdida na década de 2020, sob o olhar dos líderes de hoje. Tudo depende das decisões que esses líderes tomarem – ou deixarem de tomar –, especialmente nos próximos dezoito meses.” António Guterres, secretário-geral do ONU