Razões para escrever cartas à mão

10 de Setembro 2020

Há inúmeros estudos científicos sobre os benefícios de escrever em papel, à mão. Mas uma carta vai ainda mais longe. Aproxima pessoas, cria memórias, é terapêutica…

Se há algo que a pandemia e o confinamento nos veio relembrar, foi a importância que os relacionamentos têm para o nosso bem-estar. Quanto mais próximos, melhor. E haverá algo mais próximo do que receber notícias de quem amamos, escritas pelo seu próprio punho? É como se a folha de papel guardasse em si a essência de quem a manuseou, e, por instantes, enquanto a desdobramos, sentimos, cheiramos, e até beijamos, o remetente está mesmo ali ao nosso lado. Podemos até ter algumas dificuldades em ler, mas cada gatafunho que tentamos decifrar enche-nos o coração de alegria. Curiosamente, a mesma alegria invadiu quem esteve do outro lado do processo, enquanto escolhia o melhor papel, a caneta mais suave, procurava as palavras certas e aprimorava a caligrafia.

Escrever cartas à mão é uma atividade praticada há centenas de anos, que não exige equipamentos ou treinos especiais, custa pouquíssimo dinheiro e é acessível a praticamente toda a gente. Vamos a isso?

Escrever cartas à mão…

… cria memórias duradouras

Vários estudos mostraram que pegar numa caneta e em papel, em vez de agarrar no teclado, aumenta a nossa capacidade de memorizar o que escrevemos e o que lemos, pois a informação é retida mais profundamente. Mas quando se recebe uma carta não é só o que ela contém que conta: o próprio gesto em si já cria uma memória especial.

… aprofunda relacionamentos

O trabalho extra que é colocado na elaboração de uma carta já demonstra bem a importância que o destinatário tem. Além disso, quando faz uma pausa para escrever uma carta, não está a reagir no imediato a um SMS, nem a procurar uma resposta rápida por e-mail a uma necessidade de informação. O remetente está deliberadamente a refletir sobre aquilo que quer dizer e porquê. O resultado só pode ser importante e profundo.

… permite personalizar

É verdade que pode usar emojis para transmitir emoções através de mensagens eletrónicas, mas imagine, então, o que pode fazer com uma folha de papel em branco! Com cores, desenhos, sublinhados, uma flor seca, um borrifo de perfume, uma mancha de café, ou de uma lágrima…

… é terapêutico

Há até estudos sobre isso. O hábito de escrever cartas de agradecimento torna as pessoas mais felizes, mais preenchidas e com menos sintomas de depressão. Dizer às pessoas que o rodeiam, de uma forma tão tangível, o quanto gosta delas, só pode correr bem.

… valoriza cada palavra

Cumprir o limite de caracteres de cada tweet pode ser difícil, mas há sempre a solução de continuar a ideia no tweet seguinte. Já tentar escrever num simples postal tudo o que lhe vai na alma, é um verdadeiro desafio. É preciso pesar bem o valor de cada palavra, porque também não dá para ir escrevendo e depois fazer delete.

… retira a pressão

Os nossos meios modernos de comunicação encorajam a reação rápida, o que coloca pressão sobre o destinatário e sobre nós, ansiosamente à espera do “plim” que nos diz que a mensagem foi entregue, do “plim” que diz que foi lida e do “plim” de resposta recebida. Já uma carta é uma forma atenciosa de contacto, que retira a pressão da resposta, sobretudo quando as pessoas já não se falam há muito tempo.

… permite exibir os nossos dotes

Se há coisa que pode ser melhor em formato digital do que escrita à mão são as receitas médicas, não é? Mas se a sua caligrafia for bem melhor que a de um médico, escrever uma carta é uma boa forma de exibir essa arte em desuso, que revela muito sobre cada pessoa. Sinta-se à vontade para juntar alguns floreados.

… desintoxica do digital

Tirar os olhos dos ecrãs durante alguns minutos. Agarrar numa folha, sentir a sua textura. Cheirá-la. Pensar bem antes de escrever. Observar os desenhos da tinta. Dobrar o papel. Não lhe parece uma pausa relaxante? E para quem recebe, há investigação que prova que ler em papel aumenta a atividade neural da mesma forma que a meditação.

… é para sempre

A correspondência eletrónica acaba por “desaparecer” numa sequência longa e fastidiosa de mensagens. E, daqui a 20 anos, será que a nova tecnologia ainda nos permite ler os textos de hoje? Já as cartas em papel podem ser lidas e manuseadas muito depois de os emissores e recetores terem partido, são expostas em museus, guardadas em caixas mais ou menos secretas… preservam uma história.