O equinócio que nos faz entrar no outono

16 de Setembro 2022

Os dias e as noites com a mesma duração anunciam-nos a chegada do outono. O equinócio marca a nova estação, com todo o seu simbolismo e rituais.

Na madrugada de sexta-feira, dia 23 de setembro, às 2h03m, o sol estará a incidir na Terra com a mesma intensidade nos dois hemisférios. É o momento do equinócio que marca o início do outono no hemisfério norte e da primavera no hemisfério sul. Nesse momento, nenhum dos pólos da Terra está mais perto do sol do que o outro. Os raios solares atingem a linha do equador verticalmente, fazendo com que o dia e a noite tenham a mesma duração. É precisamente esse o significado da palavra equinócio: “noite igual” — com origem no latim “aequus” (igual) e “noctium” (noite).

Um fenómeno astronómico que ganhou um enorme simbolismo ao longo da história da humanidade. Esta data foi, e ainda é, motivo de celebração em inúmeras culturas, com rituais associados às colheitas que, literal e simbolicamente, são uma preparação para as estações mais frias.

Na natureza, o outono é a estação em que as árvores se despem e os animais que hibernam planeiam os meses em que há escassez de alimentos. Deixar ir o que não é fundamental, dar atenção à casa, conservar alimentos para os meses frios e agradecer fazem parte do espírito da estação e inspiraram rituais que perduram até aos dias de hoje.

O Mabon ou “Festival da segunda colheita” é um desses rituais, que faz parte das culturas pagãs celtas. Em meados do séc. XX, muitas das tradições e valores desta cultura foram recuperados. O dia do equinócio era um dia sagrado dedicado à celebração e ao agradecimento à Mãe Terra pela abundância das colheitas de verão. Esse agradecimento materializa-se em juntar grãos de cereais, folhas secas, maçãs, nozes e abóboras num arranjo de outono. A maçã não pode faltar, no Mabon, como símbolo da renovação, regeneração e integridade.

A romã é outro fruto associado ao equinócio de outono, por conta da mitologia grega. Reza o mito que foi o rapto de Perséfone, filha de Zeus, por Hades, que determinou o domínio da escuridão em metade do ano e, assim, a natureza cíclica das estações. A romã foi o fruto que Hades ofereceu a Perséfone. Ao comer alguns grãos, esta passou a pertencer-lhe.

Chineses e vietnamitas celebram a lua cheia mais próxima do equinócio, associando-a à fertilidade e colheitas abundantes. No Festival da Lua Cheia ainda hoje as famílias se reúnem, há iluminação festiva pelas ruas e partilham-se os tradicionais “moon cakes” (bolos da lua).

Com ou sem rituais, o início do outono pode ser uma boa época para balanços e adoção de novos hábitos que tragam maior bem-estar ou permitam alcançar novos objetivos. Afinal, é uma estação de transformação e também de maturidade, reconexão e equilíbrio.

O outono dos escritores

Se o outono nos vira para dentro, tanto literal quanto metaforicamente, não é de estranhar que escritores e poetas se sintam especialmente realizados e inspirados nesta — e por esta — estação do ano. Vale a pena conhecer algumas reflexões literárias e poéticas sobre o tema:

“Repara que o outono é mais estação da alma que da natureza”

Carlos Drummond de Andrade

“O outono é a estação mais suave, e o que perdemos em flores, mais do que ganhamos em frutas.”

Samuel Butler

“Abril nunca significou muito para mim, o outono parece aquela estação do começo, a primavera.”

Truman Capote

“O outono é uma segunda primavera, cada folha uma flor.”

Albert Camus

“Quando, Lídia, vier o nosso Outono

Com o Inverno que há nele, reservemos

Um pensamento, não para a futura

Primavera, que é de outrem,

Nem para o Estio, de quem somos mortos,

Senão para o que fica do que passa —

O amarelo actual que as folhas vivem

E as torna diferentes.”

Fernando Pessoa (Quando, Lídia, vier o nosso Outono)

“Tarde pintada

Por não sei que pintor.

Nunca vi tanta cor

Tão colorida!

Se é de morte ou de vida,

Não é comigo.

Eu, simplesmente, digo

Que há fantasia

Neste dia,

Que o mundo me parece

Vestido por ciganas adivinhas,

E que gosto de o ver, e me apetece

Ter folhas, como as vinhas.”

Miguel Torga, Outono, Diário X (1966)

Por que não acontece o equinócio sempre no mesmo dia?

Porque o movimento de translação da Terra faz-se em ciclos que não correspondem exatamente a 365 dias, mas sim a 365 dias mais cinco horas, 48 minutos e 48 segundos. Assim, em cada ano, atinge-se o equinócio – que não é mais do que um momento no movimento de translação da Terra – perto de seis horas mais tarde do que no ano anterior. Ao fim de quatro anos, essa diferença atinge quase 24 horas, mas o ano bissexto vem fazer uma correção, que permite que o equinócio de outono aconteça sempre entre os dias 22 e 23 de setembro.

No equinócio, o Sol está no ponto mais próximo da linha do equador, fazendo com que a sua luz e o seu calor cheguem com a mesma intensidade aos dois hemisférios.