As soluções climáticas naturais representam um terço das ações necessárias para atingirmos as metas do aquecimento global. Reflorestar é uma ideia com futuro.
Nos últimos 50 anos, a população global duplicou, aumentando a procura por alimentos, energia e materiais, e colocando pressão acumulada sobre os recursos. No mesmo período, a economia cresceu quase cinco vezes. Uma economia extrativa, baseada em soluções fósseis, que falhou em valorizar o capital mais precioso do planeta: a natureza.
Chegámos a um ponto de não retorno, em que temos de encontrar formas de continuar a satisfazer as necessidades das pessoas, respeitando os limites do planeta. Precisamos de fazer a transição de uma economia fóssil e linear para um paradigma de bioeconomia circular e inclusiva, neutra em termos de clima, que se desenvolva em harmonia com a natureza.
Neste novo paradigma económico, há um ecossistema que, porque é o maior sumidouro terrestre de carbono, o principal hospedeiro da biodiversidade terrestre e a nossa maior fonte de recursos biológicos não alimentares, desempenha um papel crucial: a floresta.
Liderar a mudança
Quando nos apercebemos que, em termos de emissões de gases com efeito de estufa, a humanidade está a fazer um trajeto que nos levará a exceder o limite de 1,5°C de aquecimento global, o valor que a generalidade dos especialistas considera admissível, importa encontrar soluções viáveis que nos permitam evitar esse rumo e responder de forma assertiva ao nosso desafio mais urgente.
Investigações recentes demonstram a importância das “soluções climáticas naturais” para contrariar este processo de degradação dos ecossistemas, que, além dos impactos ambientais, conduzirá a uma redução de 7,2 por cento no PIB per capita global até 2100(1).
O estudo “Natural climate solutions”(2), de Griscom et al., defende que as soluções climáticas naturais representam 30 por cento das ações necessárias para se atingir os objetivos climáticos (mais do que o setor dos transportes, por exemplo), com um custo efetivo de apenas três por cento do global(3).
De acordo com este estudo – que elenca um conjunto de 20 ações de conservação, restauração e/ou melhor gestão da terra nas florestas, pântanos, pastagens e terras agrícolas, para aumentar o armazenamento de carbono e/ou evitar emissões de gases de efeito estufa –, 73 por cento das oportunidades das soluções climáticas naturais residem nas florestas. E cerca de metade destas têm a ver diretamente com a reflorestação.
Mark Wishnie, diretor de Sustentabilidade do BTG Pactual Timberland Investment Group, que gere mais de 1,3 milhões de hectares de plantações florestais no continente americano, esteve em Portugal no final do ano passado, no Fórum de Sustentabilidade da The Navigator Company, a falar, exatamente, sobre “O papel das soluções baseadas na natureza na bioeconomia”. Aí defendeu a necessidade de se fazer reflorestação de forma massiva, dando números concretos: vamos precisar de plantar 200 milhões de hectares até 2030, para atingir o objetivo de mitigação das alterações climáticas. Uma área que, de acordo com este especialista, é pelo menos o dobro da superfície atualmente plantada pela indústria florestal.
A reflorestação, conforme referido no estudo de Griscom et al., representa 50 por cento das ações necessárias para o cumprimento das metas climáticas. Mark Wishnie acrescenta que a plantação de florestas de produção deve ser feita em conjunto com outras medidas, nomeadamente evitar a perda de solos florestais por conversão para outros usos (por exemplo, para agricultura e pastos para animais, atualmente a maior causa da redução da floresta no mundo); promover a gestão florestal sustentável; investir em plantações melhoradas; e gerir parte destas florestas com objetivos de conservação, assegurando os serviços ambientais que nos proporcionam.
A reflorestação é vital e implica benefícios diretos de remoção do dióxido de carbono da atmosfera e armazenamento de carbono na biomassa e solo florestal, mas o poder do setor vai além disso. “Há benefícios adicionais quando pensamos na floresta como um todo e como fonte de materiais renováveis”, refere Wishnie. A contribuição do setor florestal reside também nos produtos de madeira, que armazenam carbono ao longo de todo o seu ciclo de vida; no efeito de substituição de materiais de origem fóssil por materiais lenhosos renováveis; e nos processos de circularidade, com reutilização da madeira, o seu uso em cascata e posterior reciclagem. Estas vantagens, quando combinadas, “podem trazer duas a três vezes mais benefícios climáticos, em termos de retenção de carbono, do que a floresta só por si”, salienta o especialista.
A madeira e o setor florestal
“Quando percebemos que não se associa uma mesa de madeira à floresta da mesma forma que se associa um tomate a uma quinta, vemos que a sociedade tem uma perceção errada acerca do setor florestal”, diz Mark Wishnie. De facto, uma pesquisa realizada em 2017 mostrou uma lacuna vertiginosa entre a perceção que a sociedade tem do produto “madeira”, considerado por 76% dos inquiridos como o material mais renovável, e a perceção que tem do setor florestal – apenas 16% o classificou como ambientalmente responsável.
Esta hiato na perceção dificulta a aceleração do processo de transição para uma bioeconomiade base florestal, impedindo a criação de políticas que credibilizem o setor enquanto verdadeiro motor de liderança no que diz respeito às alterações climáticas.
Wishnie condensa a necessidade de ultrapassar esta diferença numa frase-chave: “Se não encontrarmos formas de fazer com que as nossas florestas ajudem a enfrentar o problema climático, teremos desaproveitado uma oportunidade única”.
A contribuição do setor florestal reside também nos produtos de madeira, que armazenam carbono ao longo de todo o seu ciclo de vida.