Quando o céu se ilumina, o planeta paga a conta

29 de Dezembro 2025

O fogo de artifício continua a ser um símbolo de festa. Mas o espetáculo tem um lado sombrio: os impactos nocivos no ambiente e nos animais. Os efeitos do ruído extremo, da poluição do ar e dos resíduos no solo e na água prolongam-se muito para além do último aplauso.

O nível de ruído produzido pelo fogo de artifício chega a ultrapassar os 150 decibéis, um valor semelhante ao de um avião a descolar. Para os animais domésticos, este som súbito e imprevisível está longe de ser percebido como festa e alegria, desencadeando respostas de stress agudo. Estudos citados pelo International Fund for Animal Welfare (Fundo Internacional para o Bem-Estar Animal) demonstram um aumento de comportamentos de fuga, tremores, vocalizações intensas e acidentes nas horas que se seguem a espetáculos pirotécnicos. Associações de proteção animal e clínicas veterinárias registam também um aumento de animais perdidos após noites festivas.

Na fauna selvagem, os efeitos são menos visíveis, mas potencialmente mais graves. Por exemplo, segundo um estudo da Anglia Ruskin University (Reino Unido), as aves expostas a fogos de artifício noturnos levantam voo de forma abrupta, consumindo energia essencial, sobretudo no inverno, e abandonando zonas de repouso. A desorientação causada pelo ruído e pela luz artificial pode provocar colisões, alterações nos padrões de alimentação e maior vulnerabilidade a predadores. Em ecossistemas já pressionados pela urbanização, estes episódios de stress repetido tornam-se mais um fator de desequilíbrio.

O que fica no ar, no solo e na água

Para além do impacto sonoro, os fogos de artifício libertam partículas finas e metais pesados como estrôncio, bário, cobre e alumínio, responsáveis pelas cores das explosões. Estudos publicados em revistas científicas – como a Atmospheric Environment e a Environmental Science & Technology – mostram que, após grandes espetáculos pirotécnicos, a concentração destas partículas muito finas no ar aumenta de forma acentuada, ultrapassando claramente os níveis normalmente registados. O problema é que são suficientemente pequenas para penetrar profundamente nos pulmões, afetando a saúde humana e animal.

Mas a poluição não se limita ao ar. Com a chuva, parte destes compostos deposita-se no solo e pode atingir linhas de água. A isto somam-se os resíduos físicos deixados no terreno, como cartuchos e fragmentos de plástico. Embora muitos destes efeitos sejam temporários, a repetição frequente de eventos pirotécnicos levanta preocupações sobre a acumulação local de contaminantes e a degradação dos habitats.

Novos caminhos para a celebração

Perante este cenário, algumas cidades estão a repensar a forma de celebrar. Por exemplo, nos Países Baixos os fogos de artifício para uso privado foram proibidos a nível nacional, enquanto em municípios de Itália e Espanha várias festas locais recorrem a pirotecnia de baixo ruído como resposta às preocupações com o bem-estar animal e a poluição sonora. Já em várias cidades dos Estados Unidos da América, os fogos de artifício têm vindo a ser substituídos por espetáculos de drones, de luz e de projeção.

Por cá, onde as celebrações continuam muito assentes no fogo de artifício tradicional, a margem de ação individual é reduzida. Na prática, o que cada pessoa pode fazer incide sobretudo na proteção dos seus animais de estimação: fechar janelas e estores, criar um espaço seguro e confortável dentro de casa, manter a identificação no chip e na coleira atualizada e evitar passeios nos horários em que está previsto o lançamento de fogo de artifício.

Celebrar faz parte da vida coletiva das comunidades, e é bom que assim seja. Mas, sem abdicar desses momentos de união, talvez seja possível fazer a festa sem ignorar o rasto duradouro que fica depois do brilho momentâneo no céu.

Para além do impacto sonoro, os fogos de artifício libertam partículas finas, suficientemente pequenas para penetrar profundamente nos pulmões, afetando a saúde humana e animal.