Fractais: a geometria calmante da natureza

17 de Junho 2022

Na base da natureza, há um estranho tipo de matemática. Os fractais, padrões geométricos replicados em várias escalas, são uma das razões por que nos sentimos tão descontraídos e revigorados depois de caminharmos no meio de uma floresta.

Há quem lhe chame a impressão digital de Deus, pela beleza das suas formas e pela perfeição dos seus desenhos. Os fractais são a estrutura escondida na desordem aparente que é, por exemplo, um conjunto de nuvens no céu.

Foram identificados pela primeira vez pelo matemático Benoit Mandelbrot, em 1975, e, desde então, muitos investigadores os têm estudado, não só na sua abstração geométrica, mas também pelo efeito que têm nos seres humanos. Mesmo sem sabermos, e sendo aparentemente complexos, eles são os nossos padrões preferidos, e contemplá-los permite-nos repousar o cérebro.

Podemos vê-los num floco de neve ampliado, nos ramos de uma árvore, nas formas geométricas de uma couve romanesca, na estrutura dos corais, no desenho das galáxias, no centro de uma flor, na linha de costa dos continentes, nas plantas suculentas, nas ramificações de rios e afluentes e em tantas, tantas outras formas da natureza.

Os fractais estão em todo o lado, incluindo no corpo humano – nos circuitos neuronais, nos pulmões, com a sua árvore respiratória de brônquios e bronquíolos, ou na extensa rede de vasos capilares, mostrando-nos que também nós fazemos parte da mãe natureza.

Num fractal, cada uma das pequenas partes do padrão, ou seja, de toda a estrutura geométrica, é, exata ou aproximadamente, uma cópia de tamanho reduzido do todo. Esta característica dos fractais chama-se, em matemática, autossimilaridade, e é ela que os torna tão fascinantes para o cérebro humano.

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“É para isto que estou destinado a olhar”

Os efeitos positivos do contacto com a natureza não vêm só de inspirarmos um ar mais puro, com cheiro de terra e de plantas, ou de ouvirmos sons relaxantes como o canto dos pássaros ou a brisa nas folhas das árvores. As imagens que chegam ao nosso cérebro, através do olhar, têm um enorme poder relaxante, aparentemente decisivo, e a explicação parece residir precisamente nos fractais.

Uma simples imagem da natureza tem, só por si, efeitos relaxantes, segundo um estudo de 2013. Ficou demonstrado que apenas olhar para uma imagem de árvores pode alterar positivamente a forma como o organismo recupera as funções do sistema nervoso, depois de uma crise aguda de stress mental.

O efeito que os fractais têm sobre o cérebro humano, com benefícios físicos, mentais e emocionais, tem sido estudado a fundo, desde há décadas, pelo físico Richard Taylor, da Universidade de Oregon (EUA). Segundo ele, o nosso olhar está treinado por milhares e milhares de anos de contacto com a natureza e com os seus padrões fractais. A esse treino o investigador chamou “fluência fractal” – tal como se estivéssemos a falar do domínio de uma linguagem, que é o que acaba por ser a autossimilaridade. E aos fractais o especialista chama “redutores naturais de stress”.

“Os nossos olhos evoluíram para observar esses padrões”, afirma Richard Taylor numa entrevista para o podcast “Your Outside Mindset”. “Quando andamos na natureza e olhamos para esses fractais é como se o nosso sistema visual acordasse e dissesse ‘ah, é para isto mesmo que estou destinado a olhar’. Isso abre uma comporta de emoções e de redução do stress”, explica. “Quando olhamos para um dos padrões fractais da natureza, os níveis de stress podem ser reduzidos até 60 por cento. Esse efeito inunda todo o nosso corpo, que relaxa nessa mesma proporção!”

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Uma preferência ancestral

Num dos muitos estudos em que Richard Taylor esteve envolvido, concluiu-se que a preferência do ser humano por fractais pode ser identificada muito cedo, em crianças antes dos três anos de idade. “O nosso sistema visual está sintonizado para processar melhor estes padrões que são altamente prevalentes na natureza”, diz Kelly E. Robles, uma das autoras do estudo. “Assim, uma vez que as crianças não estão intensamente expostas aos padrões fractais naturais, esta preferência deve vir de algo anterior em desenvolvimento, ou até talvez sejam inatas”.

Na próxima caminhada pelo meio da floresta, talvez olhemos de forma diferente para cada árvore, para as suas folhas e para os seus ramos, tentando descobrir neles, desta vez de forma consciente, os fractais escondidos naquele caos aparente. Que isso seja só mais um motivo de descontração. Mesmo para quem nunca gostou de matemática.

Floresta: um banho de fractais

Não é por acaso que as terapias que envolvem os benefícios da natureza passam tantas vezes pela floresta. Esta é um ecossistema muito rico em fractais. Basta pensarmos em cada árvore: o tronco divide-se em grandes ramos, que se dividem em galhos mais pequenos, que por sua vez dão origem a outros galhos mais pequenos ainda, de onde nascem as folhas, que podem reproduzir, elas também, nos seus veios, o mesmo padrão fractal. Cada árvore é um desenho infinito e um exemplo de autossimilaridade. Mesmo sem termos consciência desses padrões, o nosso cérebro identifica-os. E relaxa.

FRACTAL – forma geométrica complexa, de aspeto fragmentado, que pode ser subdividida indefinidamente em elementos que parecem cópias reduzidas do todo. (in Infopedia – Dicionário Porto Editora