História de uma indústria de projeção mundial
26 de Maio 2025
A produção de pasta e papel a partir de eucalipto projetou Portugal a nível mundial e permitiu apoiar o desenvolvimento rural e a economia nacional.
O eucalipto serviu de base, a partir de meados do século XX, a uma indústria pioneira e de sucesso a nível mundial, em termos de competitividade, qualidade dos produtos e prestígio internacional – falamos do setor da pasta e dos papéis brancos de eucalipto. Mas a decisão de desenvolver uma indústria de produtos florestais em Portugal tem raízes mais antigas, nas políticas públicas.
Foi ainda no século XIX, em 1886, que se deu uma viragem fundamental na política florestal: a expansão da arborização nas propriedades públicas foi considerada prioritária, tendo sido reforçada a distribuição de plantas e o apoio à propriedade privada. As áreas florestais expandiram, sobretudo as de sobreiro e de pinheiro. Já a Lei do Povoamento Florestal de 1938, que levou à arborização das dunas do litoral e dos baldios serranos, deu origem à controvérsia da “pinhalização” do país, que antecedeu em cerca de 25 anos uma polémica idêntica de “eucaliptização”, devido ao crescente interesse económico pela espécie.
Já no século XIX se produzia papel de forma industrial em Portugal, mas a partir de trapo de algodão e de palha. Foi na sequência da política de industrialização do país, durante o Estado Novo, que se deu prioridade à reestruturação do setor através do fomento inicial da cultura do eucalipto e da identificação de eucaliptos com aptidão madeireira.
A entrada em funcionamento da fábrica de Cacia da Companhia Portuguesa de Celulose (financiada pelo Plano Marshall), em 1953, e o início da sua laboração com madeira de eucalipto, em 1957, foi essencial para o incremento da florestação com esta espécie. O estabelecimento de novas fábricas de pasta de eucalipto (Socel, Caima e Celbi) na década de 1960, e, nas décadas de 1960-1970, o apoio do Estado a projetos com eucalipto, através do Fundo de Fomento Florestal, contribuíram para o crescimento da área de eucaliptal.
Com a entrada de Portugal na então Comunidade Económica Europeia, em 1986, houve novas mudanças no setor florestal – incluindo o Projeto Florestal Português apoiado pelo Banco Mundial, destinado a incrementar significativamente a oferta interna de pinheiro-bravo e de eucalipto.
O incremento da florestação com eucalipto deveu-se principalmente aos proprietários privados, o que deu origem a que alguns grupos políticos e ambientalistas pedissem restrições legislativas à expansão da espécie. Desde 1985, com o grande incêndio do Caramulo, e sempre na sequência de épocas de fogos florestais gravosos, os agentes florestais e económicos têm sido confrontados com legislação reativa, desordenada e crescentemente restritiva, penalizadora para os privados e para um setor competitivo, que investe há décadas no desenvolvimento de práticas silvícolas responsáveis e é um motor de desenvolvimento rural do País.
As metas nacionais para espécies florestais surgiram em 2006/2007, com a Estratégia Nacional para as Florestas (EFN) e os Planos Regionais de Ordenamento Florestal (PROF). A ENF foi atualizada em 2015, com novas metas para o eucaliptal e, em 2017, a nova redação do regime jurídico aplicável às ações de arborização e rearborização (RJAAR) criou, pela primeira vez, condicionamentos específicos à instalação de eucaliptos.
O eucalipto na base de uma indústria pioneira
Apesar de o plano do Estado Novo, de fomentar a criação de uma indústria transformadora de base florestal, estar de início orientado para a madeira de pinho, o feliz acaso da espécie Eucalyptus globulus se ter adaptado tão bem ao território nacional, bem como o saber e a qualidade de equipas nacionais de I&D florestal e industrial, que descobriram que a pasta produzida por esta madeira tinha propriedades muito úteis, permitindo também rendimentos de produção superiores e um produto de destacada qualidade, conduziu ao uso preponderante do eucalipto na produção de celulose em Portugal. Isso permitiu cumprir os objetivos de reduzir a dependência de Portugal da importação de pastas e papéis, e criar emprego e riqueza para o país.
O abastecimento de madeira para a crescente capacidade instalada de fabrico de pasta de eucalipto, ao longo das últimas décadas do século XX, a que se juntou a produção de papel, já na década de 90, foi um grande estímulo ao crescimento da floresta de eucalipto em Portugal continental.
Desde então, a produção industrial continuou a registar um crescimento expressivo, dinamizando o tecido florestal, industrial e de prestação de serviços associados – produção florestal, serviços silvícolas, energia, papel e cartão, produtos de embalagem, equipamentos industriais, serviços de manutenção, logística, etc. –, que potencia o desenvolvimento económico e o emprego no meio rural. E, fruto da elevada incorporação de matérias-primas, emprego e serviços de origem totalmente nacional, as exportações da indústria de pasta e papel, para além do seu elevado e destacado valor, são as que trazem maior valor acrescentado ao País.
No entanto, apesar de as florestas ocuparem mais de um terço do território português, a madeira nacional não é suficiente para suprir as necessidades crescentes da indústria, pelo que se têm registado aumentos sistemáticos das importações. Esta situação não só desperdiça o potencial florestal português, como quanto maior for a importação de eucalipto, envolvendo o transporte, a diferença na qualidade e os custos e preço superiores aos da madeira nacional, menor será a capacidade da indústria para remunerar a produção nacional, já que o preço a que o país pode vender pasta e papel no mercado externo é ditado pela concorrência mundial.