É possível fazer do Natal uma época de paz também com a natureza? Símbolos como o azevinho, o musgo ou o pinheiro enfeitado chegam até nós através de tradições antigas. Mas, hoje, devem inspirar, antes de mais, a sua proteção.
O Natal é uma época carregada de símbolos que associamos aos valores da quadra: família, solidariedade, paz e união. Sem grandes reflexões, recorremos a uma série de elementos que nos fazem reviver, a cada ano, esses valores. Mas, se pararmos para pensar, percebemos que também a natureza, por estar presente em tantos deles, tem lugar de honra na festa. Do azevinho ao pinheiro do Natal, do musgo à neve, do burro e da vaca às renas que puxam o trenó do Pai Natal, são inúmeros os símbolos que nos chegam diretamente do mundo natural e dos ciclos que o regem.
Hoje, torna-se especialmente importante trazer a natureza para o centro – não só o centro da mesa e das decorações natalícias, mas o centro simbólico da nossa atenção. Celebrar a família, com mais ou menos convicções religiosas, deve ser também celebrar todo o equilíbrio com os ecossistemas, dos quais fazemos parte e dos quais dependemos.
O azevinho e o seu sósia
Com folhas verde-escuro, brilhantes e recortadas, e bagas vermelho-vivo, a espécie Ilex aquifolium tornou-se um verdadeiro ícone do Natal. Mas muito antes de haver uma celebração cristã, o azevinho já era venerado pelos Celtas, pela sua capacidade de se manter verde durante todo o inverno e de pintalgar de vermelho as paisagens geladas. Tornou-se, assim, um símbolo pagão de imortalidade e proteção, que facilmente se “colou” à tradição cristã do Natal. A associação do azevinho à espiritualidade é tão antiga que, na língua inglesa, o seu nome é “holly” – que significa “sagrado” ou “santo”.
Em Portugal, para além dessa simbologia ancestral, é considerado uma espécie relíquia, sobrevivente das florestas subtropicais (Laurissilva) que cobriam o território antes da era glaciar. Desde 1989, é uma espécie protegida e, por isso, estão proibidos o arranque, o corte total ou parcial, o transporte e a venda de azevinho espontâneo, em todo o território de Portugal continental. É possível, no entanto, adquiri-lo em hortos e viveiros.
Mas nem só o azevinho traz bagas vermelhas ao Natal. A gilbardeira – também chamado “falso azevinho” – passou a fazer também parte das decorações natalícias, graças à semelhança com Ilex aquifolium. A espécie – de nome científico Ruscus aculeatus – acusou igualmente a pressão da época natalícia, e, por isso, devemos deixá-lo no seu habitat natural, sempre que nos cruzarmos com ela.
Deixar o musgo na floresta
Ir à floresta, em família, recolher musgo para decorar o presépio é uma recordação que muitos de nós lembramos com carinho. Alguns talvez já tenhamos replicado essa memória, levando filhos ou sobrinhos a fazer o mesmo. Mas porque, sabemos hoje, o musgo tem um papel vital nos ecossistemas, devemos deixar essa tradição apenas na nossa memória. Sobretudo tendo em conta que, das mais de 300 espécies de musgo que existem em Portugal, cerca de 30% estão ameaçadas.
O musgo é um organismo vivo que retém a humidade, protege o solo da erosão, contém sementes em germinação, e serve de casa a inúmeras espécies que não vemos. É como um tapete de biodiversidade que, ainda por cima, cresce a um ritmo muito lento. Algumas espécies podem levar 20 anos a regenerar um pedaço que foi arrancado.
Alternativas sustentáveis para o seu presépio podem passar por reaproveitar papel ou tecido, ou recolher pedras ou cascas de árvores caídas.
O tradicional pinheiro de Natal e a versão artificial
A tradição de enfeitar uma árvore, e decorar a casa com ramos verdes, é muito anterior ao nascimento de Cristo. Antigas tradições pagãs transformaram-se no ícone da árvore de Natal, como a conhecemos hoje. A espécie eleita varia, contudo, de país para país.
Em Portugal, o pinheiro-bravo é a árvore de Natal mais tradicional. Mas os adeptos da sua versão natural devem garantir que estão a comprar árvores de origem nacional e provenientes da limpeza das florestas. E, claro, nunca partir para a recolha por conta própria.
Reutilizar uma árvore artificial ou adquiri-la em segunda mão são também opções sustentáveis. Segundo a DECO, uma árvore artificial tem mais impacto ambiental do que a opção natural. Mas se a usar por mais de sete anos, já não é bem assim: “A árvore artificial terá de ser utilizada durante, pelo menos, sete períodos natalícios para que os impactos ambientais que tem a mais sejam compensados”.
Celebrar o Natal em paz com a natureza, e passar esse cuidado às gerações seguintes, não dá assim tanto trabalho. Requer atenção, cuidado e presença, que darão frutos no futuro.