Vivemos numa interdependência psicológica com a natureza. Por isso, o ser humano não pode ser estudado nem “curado” sem o Planeta. Eis os princípios da Ecopsicologia, uma disciplina que defende o resgate de uma ligação profunda, terapêutica e natural.
Nascida nas décadas de 80 e 90, a Ecopsicologia baseia-se no princípio fundamental de que somos parte integrante da natureza. Com base neste pressuposto, explora a interdependência psicológica dos seres humanos com o mundo natural, analisando as suas implicações na identidade, na saúde e no bem-estar.
“Na base do sofrimento ambiental e do sofrimento humano a que assistimos nos dias de hoje está a ilusão de que o ser humano existe separado da natureza”, começa por explicar a psicóloga Ana Sevinate, autora do livro “Ser Terra: O Abraço da Psicologia à Natureza” e cofundadora do grupo “Ecopsicologia Portugal”.
Carla Fonte, psicóloga, investigadora e professora universitária, adianta: “A Ecopsicologia procura estudar as respostas emocionais à natureza, os impactos de questões ambientais, como desastres naturais e mudanças climáticas globais, e as dimensões transpessoais da identidade e preocupação ambiental”. Por outro lado, acrescenta, “aprofunda o conhecimento científico em torno do benefício para a saúde psicológica da integração de atividades ao ar livre no aconselhamento psicoterapêutico”, designadamente o seu efeito na prevenção dos problemas de saúde mental, como a ansiedade, a depressão ou o stress.
Efeitos que estão há muito cientificamente comprovados: “Investigação diversa mostra que, efetivamente, o contacto com a natureza (espaços verdes, ar livre, mar e animais) pode trazer múltiplos benefícios e efeitos positivos”, garante a investigadora. Mas quais são afinal, esses efeitos?
Do stress ao foco
Para começar, a redução do stress e da ansiedade. “As pessoas que vivem em áreas com maiores quantidades de espaços verdes apresentam, no geral, menos níveis de cortisol e reportam menos stress do que aquelas que vivem em áreas mais urbanizadas”, e as que fazem exercício ao ar livre “beneficiam não só na redução do stress mas também dos níveis de ansiedade”, revela Carla Fonte.
A par disto, verifica-se uma diminuição da depressão. “Indivíduos com depressão grave, após uma caminhada de cerca de 50 minutos num ambiente natural, beneficiam de um melhoramento altamente significativo no seu humor e cognição”, exemplifica a psicóloga.
Mas há mais: melhoria na qualidade do sono, redução de comportamentos agressivos, aumento de conexão social, maior felicidade, bem-estar e satisfação com a vida, e melhor desempenho cognitivo.
A par destes múltiplos efeitos na saúde mental, verificou-se ainda que a natureza tem também benefícios a nível da saúde física. Diminuição da tensão arterial, melhorias na insuficiência cardíaca, asma e alergias, e no controlo da dor, reforço do sistema imunitário e redução da obesidade e da diabetes contam-se entre os resultados já comprovados.
Resgatar a ligação
Tudo isto pode parecer demasiado filosófico, distante ou espiritual. Mas, no contexto atual de grande incerteza, perturbação e ansiedade – causadas pela pandemia, a guerra ou a crise climática –, a verdade é que há muitos recursos e vantagens a tirar da Ecopsicologia. “O resgate da ligação entre o ser humano e a natureza passa pelo contacto físico e psicoemocional com a natureza, pelo processo de luto face à devastação e pela consciência e ação ambientais”, defende a psicóloga Ana Sevinate.
Ainda que as pessoas estejam pouco familiarizadas com estas questões, Ana Sevinate está confiante de que se trata de “algo que vai crescendo”, até porque “existem já vários psicólogos e terapeutas comprometidos e dedicados à sensibilização”. E conclui: “Neste momento, é mais do que urgente que nos apercebamos que as dores do planeta são um reflexo das nossas, e vice-versa”.