Pais pedem fim dos manuais digitais nas escolas

22 de Abril 2024

Uma petição entregue na Assembleia da República defende a conclusão do projeto-piloto que introduziu manuais digitais em 160 escolas públicas do país e pede o regresso aos manuais em papel, enumerando os benefícios desse suporte como facilitador da aprendizagem.

A iniciativa partiu de uma mãe. Ao perceber que os filhos assistiam a vídeos e se entretinham com jogos virtuais no tempo em que deveriam estar a estudar através do computador, Catarina Prado e Castro começou a preocupar-se com os efeitos desta navegação online, supostamente didática.  Os seus filhos estão abrangidos pelo projeto do Ministério da Educação para a substituição dos manuais em papel por livros digitais, que começou, de forma gradual, no ano letivo 2020/2021. O programa é de adesão voluntária das escolas e abrange, atualmente, 23.159 alunos de todos os ciclos – do 3.º ao 12.º ano de escolaridade –, em cerca de 160 estabelecimentos de ensino de todo o país.

A preocupação desta mãe transformou-se num movimento de cidadãos – “Menos Ecrãs, Mais Vida” – e no lançamento, em dezembro passado, de uma petição pública “Contra a excessiva digitalização no ensino e a massificação dos manuais escolares digitais”.

Em três meses, a petição reuniu cerca de 4.100 assinaturas. O documento foi entregue na Assembleia da República no dia 5 de abril e pede o fim do projeto-piloto dos manuais digitais nas escolas, apontando evidências científicas para a existência de atrasos na aprendizagem associados ao uso excessivo de ecrãs em contexto educativo, e sublinhando os riscos do acesso dos alunos a conteúdos indevidos, para além da distração com canais de entretenimento disponíveis no mesmo suporte. Catarina Prado e Castro espera agora ser ouvida em audiência pela comissão parlamentar de Educação.

As razões que sustentam a petição

O documento sublinha que “todos os estudos científicos convergem na evidência da superioridade do papel e da escrita nas aprendizagens” e que as crianças nos primeiros anos de ensino “precisam de treinar a caligrafia e a motricidade fina”. Alerta, igualmente, para as consequências graves do excesso da digitalização, como a “menor capacidade de leitura desenvolvida e retenção de conhecimento adquirido/memorização através dos ecrãs”, e as “interferências no desenvolvimento cerebral normal, afetando a atenção, a memória e as capacidades de comunicação”, bem como o prejuízo da concentração quando esta é requerida em atividades mais exigentes. A petição defende, por isso, que os livros em papel são “recursos mais saudáveis e eficazes para todas as crianças”, exigindo o “fim imediato do projeto-piloto” dos manuais digitais.

As críticas ao projeto passam também pelo facto de o acesso à internet deixar de ser uma opção controlada pelos pais – que, segundo o documento, não terão sido auscultados sobre o assunto – tornando-se obrigatório para os alunos das escolas aderentes, “expondo crianças a conteúdos e sites inapropriados para a sua idade e colocando-as em risco nas redes digitais”.

Os autores da petição destacam ainda as consequências, para a saúde física, do excesso de tempo em frente aos ecrãs – “um aumento exponencial dos problemas de visão, sobretudo da miopia, que está a aparecer em idades cada vez mais jovens”, a obesidade e outros problemas “relacionados com a falta de atividade física, essencial ao desenvolvimento e crescimento saudável”.

A saúde mental, alertam, é igualmente afetada: “Temos atualmente crianças e adolescentes menos empáticos, com pouca tolerância à frustração, mais agressivos, havendo também um aumento da sua sensação de mal-estar, a fazer disparar a prevalência de casos de ansiedade e depressão”.

Suécia em marcha atrás

A petição aponta o exemplo da Suécia, reconhecida pela abordagem inovadora e progressista em relação ao uso da tecnologia na educação, e que está agora a recuperar as formas tradicionais de aprendizagem, num regresso aos livros impressos, à leitura silenciosa e à prática da caligrafia. Depois de, nos últimos quinze anos, os ecrãs terem substituído gradualmente os livros didáticos, o governo sueco está atualmente a acabar com a obrigatoriedade da aprendizagem digital em crianças com menos de seis anos, a reduzir o tempo que os alunos passam em frente aos computadores e a trazer os manuais em papel de volta para a sala de aula.

A mudança surgiu depois de serem conhecidos os resultados do último estudo internacional sobre Literacia em Leitura (PIRLS) que revelou que as crianças suecas estavam com mais dificuldades nesta área. Para já, não se trata de abandono total dos meios digitais, mas sim de uma recuperação dos livros impressos, que garanta um equilíbrio entre os dois suportes.

O documento entregue na Assembleia da República sublinha que “todos os estudos científicos convergem na evidência da superioridade do papel e da escrita nas aprendizagens”.  Os subscritores defendem, por isso, que os livros em papel são “recursos mais saudáveis e eficazes para todas as crianças”.